Se há uns tempos a brisa do Atlântico amansava o calor que se fazia sentir na costa Alentejana, no momento em que nos encontrámos no interior do Alentejo, onde o ar do Atlântico já não chega, todas as brisas que sentíamos, mesmo as de ar quente, eram a mezinha para a preguiça que nos seguia pelo ar. 

É sabido que faz calor aqui, principalmente em Julho. Porém, não era isso que nos impediria de adiar uma viagem há muito sonhada. O Alentejo é a terra ideal para dar a conhecer a serenidade de uma paisagem única em Portugal e de um povo que nos agracia mesmo no auge do calor que tornaria qualquer um de nós num ser irritado e enfastiado.  

Mesmo com o calor que nos rouba o vigor e quase que nos obriga a uma aventura pela procura da melhor copa de oliveira para nos proteger do sol, esta viagem é, sem sombra de dúvidas, uma viagem completa para os amantes de trilhos de terra batida, praias, gastronomia e paisagem. Mas antes de nos aventurarmos pelo Alentejo temos um rio para acompanhar, e é no Algarve, em Vila Real de Santo António que começamos. 

Trilho junto ao rio Guadiana, perto da aldeia do Azinhal, na região de Castro Marim

Aqui, onde o rio Guadiana se encontra com o mar, forma-se uma barreira bem delineada que separa a água doce do sal do mar, tal como o rio separa Portugal de Espanha. E ao longo de dezenas, senão de centenas de quilómetros, vamos passando por vilas medievais, construídas durante a ocupação árabe na península Ibérica, onde o Guadiana já servia como ponto de separação de territórios. Entre Vila Real de Santo António e Castro Marim, por onde seguimos, a paisagem algarvia vai-se transformando aos poucos; para quem está habituado ao típico turismo algarvio, a completa vista que se tem do Castelo de Castro Marim sobre as salinas de onde se extrai o “ouro branco”, com que douramos a comida, o Guadiana verde, o azul do mar, a terra dos nossos vizinhos logo ali ao lado, apanhará de surpresa qualquer pessoa que por aqui passe pela primeira vez. 

A chamada Grande Rota do Guadiana, que está mais direccionada pelos que se aventuram a pé por esta região, e que continua de Castro Marim em diante, leva-nos por várias aldeias como Junqueira, Azinhal, Alcaria e Odeleite. Já as localidades de Álamo e de Guerreiros do Rio, com as suas esplanadas ribeirinhas, convidam-nos a refrescar junto ao rio, com algo que nos esfrie a garganta, e dão inveja aos vários veleiros, de bandeiras alemãs, holandesas, ou britânicas, que nos acompanharam rio acima. 

Não nos podemos esquecer que é preciso manter os olhos no trilho enquanto conduzimos, apesar de não estarmos em alcatrão; e mesmo resistindo à tentação de admirar a paisagem, não evitará alguns buracos dos trilhos que avivam o prazer da condução e da adrenalina a correr no nosso sangue. A paragem mais à frente, em Alcoutim, acalmará o coração. 

Situada num vale, dividido pelo Guadiana, encontramos Alcoutim na nossa margem e, na oposta, a irmã espanhola Sanlúcar de Guadiana. Paragem obrigatória para quem se aventurar para estes lados. O peixe fresco das águas doces servirá de calmante para o estômago esfomeado e com esta vista, durante o almoço, ganhamos novo ímpeto para o resto do dia que terminará na encantadora Mértola. 

A vila situa-se quase no centro do Parque Natural do Vale do Guadiana e já no quente e sereno Alentejo, onde passaremos a noite. Esta vila faz o dia para qualquer pessoa: a vista que temos para a cidade só rivaliza com a vista que temos da cidade e, de noite, a luz laranja dos candeeiros serve para nos obrigar a afastar da vila somente para a fotografar.  

O Algarve, ao contrário do que muita gente pensa, não nos oferece só praias de arribas escarpadas e douradas, a contradizer o azul vivo do mar. O Guadiana oferece tanto ou mais que essa Algarve mais conhecido, e muito graças à diversidade paisagística e à gastronomia. O Algarve e o Alentejo parecem fundir-se bem antes da sua fronteira, que só pelo mapa a conseguimos distinguir e, aos poucos, o Alentejo e a sua paisagem, vai-se imiscuindo, dando a ideia que nos encontramos já fora do Algarve, confundindo-nos.  

Se a primeira parte desta expedição nos leva a querer que encontrámos o esplendor de Portugal, a segunda parte, no coração do Alentejo, faz-nos entrar noutro tempo. Um tempo feito de histórias e de gente que parece viver devagar, seduzindo-nos a fazer o mesmo por suas terras. 

Aguarde pela segunda parte da expedição, teremos novidades em breve!